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DreadOut

By: Bruno On: 17:53
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  • O gênero do terror, no que tange videogames e demais entretenimentos eletrônicos, se encontra numa posição de destaque de uns anos para cá. Após a explosão de criatividade de cerca de dez anos atrás, com o nascimento de títulos significativos como Siren, Fatal Frame, Penumbra e Call of Cthulhu, houve uma bela estagnada. Até mesmo grandes representantes da vertente, como Silent Hill e Resident Evil, pareciam sem chão, sem saber para onde ir. Incrível pensar que tudo mudou graças aos desenvolvedores independentes. Títulos grátis, como Slender: The Eight Pages e mods para Half-Life, como Cry of Fear, amplamente divulgados e propagados por youtubers famosos que gravam suas reações apavoradas em pavorosos vídeos de gameplay (acho todos insuportáveis e nunca entenderei aqueles que preferem assistir a jogar), apontaram para novos horizontes, muito longe daquilo que as grandes softhouses apostavam ser o caminho certo. Ponto é que o gênero do terror nunca esteve tão bem. Há para todos os gostos: adventures incríveis e barra pesada, como Scratches, experimentalismos abusando do difamado esquema de mockumentaries, como Paranormal, melancolia suicida de difícil assimilação, como The Cat Lady, nostalgia pixelizada homenageando clássicos, como Lone Survivor e apoteoses da desgraça, como o todo-poderoso Outlast. Fugindo dos holofotes dos consoles de mesa e encontrando moradia nas trevas das lojas digitais, as raízes do terror estão mais fortes e profundas do que nunca, com futuro promissor: Soma, The Forest e Among The Sleep são só alguns exemplos. Em meio a tão prolífero cenário, nasce uma desenvolvedora indonésia com um único objetivo: assustar você, curioso jogador desbravador do desconhecido. Responda com sinceridade: qual foi a última vez que você jogou algo da Indonésia? Exatamente.

    Aquela velha história de cidades mal-assombradas (só que na Indonésia)


    Formada por cerca de vinte membros, fãs incondicionais de terror e, em especial, de Fatal Frame, a Digital Happiness (excelente nome), acreditando ter algo significativo em mãos, angariou fundos através do Indiegogo, chegando assim a uma demo de seu trabalho de estreia, DreadOut, alcançando atenção e vencendo o teste de fogo do Greenlight do Steam. Apenas por exposição a algumas imagens é possível concluir que DreadOut é mesmo feito por e para viúvas da série de fantasmas da Tecmo. Garotas colegiais desamparadas enfrentam entidades espirituais em locações decrépitas portando câmeras exorcistas. O negócio é bem preto no branco, o que não chega a ser algo necessariamente ruim, dado estarmos lidando com uma cultura tão distinta, e isso transparece no jogo. Menos do que eu gostaria, mas as estranhezas estão lá. Fugindo de convencionalismos do terror moderno (primeira pessoa, proposta mais concreta) e voltando a conceitos mais primitivos (câmera mais travada, seres sobrenaturais como inimigos), DreadOut é bastante simples, porém eficaz: é possível se sentir desamparado naquela cidade abandonada de tão recôndita civilização, mesmo que, a princípio, a sensação seja de mediocridade e aversão.

    Tal qual tantas produções voltadas para o público adolescente fã de terror, a trama dispara com um grupo de amigos numa viagem pelo interior. São jovens tolos agindo como tais, aparte com o sonho macabro de Linda, a protagonista muda da história. Nele, uma bela mulher recita versos numa língua que imagino ser indonésio (uma pena não ser possível escolher jogar dublado com este idioma, ou é tudo inglês, ou é tudo indonésio; e a dublagem, certamente, não é dos pontos fortes do todo). Ao despertar, Linda se encontra em meio a seus amigos, no banco de trás de uma van que transita por uma estrada bastante esburacada. Uma ponte interditada força o grupo de seis, encabeçado por aquela que parece ser a professora, a caminhar por entre a mata, alcançando assim uma cidade abandonada. Trazendo consigo seu inseparável telefone celular, Linda, juntamente com seus amigos, explora a cidade de maneira bastante convencional. Há recortes de jornal, revistas e cartazes que dão uma vaga ideia do que ocorrera ali, mas, infelizmente, o aspecto visual da investigação se prova um tanto quanto limitado, já que não há tradução para aquilo que aparece escrito em paredes, outdoors e coisas do tipo - espero que atualizações futuras tragam legendas para isso. As coisas começam a acontecer quando o grupo chega até o colégio local, ao cair da noite. Grande parte deste primeiro ato - DreadOut é dividido em dois, com o segundo prometido para breve e de forma gratuita para todos que adquiriram o primeiro - se dá enquanto da exploração do decrépito colégio e é aí que o celular de Linda se tornará de primeira importância. Tal qual a Camera Obscura da série Fatal Frame, o telefone tem o poder de lutar contra os antigos espíritos do mal que habitam o lugar. 

    Smartphone x Camera Obscura



    Antes de desenvolver os porquês de DreadOut, cabe a recomendação: não entre no colégio ao cair da noite. Não sei exatamente o porquê de tal decisão por parte dos desenvolvedores, mas há muito a ser explorado na cidade em meio as trevas e nada disso faz parte de forma efetiva do desenvolvimento do jogo em si. Talvez seja uma forma de estimular releitura? Não saberia dizer, mas não deixe de investigar a cidade. Coisas pavorosas habitam por lá após o sol se pôr. DreadOut não se esforça em absoluto para ser original. Desde posicionamento de câmera (o já batido over the shoulder, intercalado pelo POV com as mãos apontando o celular), até seus cenários (trata-se, em primeira importância, de um colégio abandonado) e resolução de quebra-cabeças, tudo já foi visto antes. Até mesmo a forma como fantasmas machucam Linda é bem parecido, aparte por dois pontos: há o famigerado sistema de autorregeneração de energia e, quando de sua morte, o limbo se torna atuante, chegando a ajudar o jogador com dicas pontuais. Por mais que semelhanças entre DreadOut e Fatal Frame sejam muitas, há pontos que os distanciam mesmo que de forma tacanha. Enquanto Fatal Frame se apresenta mais "videogame", com evolução de sua "arma primária" e até inserção de sistema de pontuação, DreadOut é mais limpo em proposta. Aparte com relíquias místicas, cuja função é bastante obscura, seus itens são normais e imediatos, sem funções absurdas - uma tesoura serve para cortar algo, por exemplo. E há problemas técnicos que incomodam: em corredores apertados, a câmera por vezes foge para a sala ao lado e o ruído indicador da proximidade de algum item dispara e não há nada lá; a trilha sonora (absolutamente tenebrosa, devo ressaltar) muitas vezes parece fora de lugar, antecipando momentos de forma errada. A animação de tudo que não é sobrenatural parece artifical nas poucas cutscenes apresentadas - algo que remete à marionetes. De uma forma geral, os gráficos não impressionam em absoluto, mas é possível criar planos legais com o celular em meio às sombras. Outra coisa que pode repudiar muitos: é possível concluir a jogatina de forma breve, tomando não mais que um par de horas para tal (esmiuçados, como eu, de certo dobrarão o tempo - há muito a explorar no campo visual). Então por quê, ainda assim, DreadOut é digno de atenção? Ao meu ver, pelas entidades folclóricas estranhíssimas que precisamos enfrentar. 

    Pocongs, Palasiks e Matianaks



    Após desmaiar e despertar sozinha (alguma dúvida que isso iria acontecer?), Linda se encontra no saguão do colégio, desorientada e amedrontada. A lanterna do celular (cuja bateria dura por tempo indeterminado) guia seus passos débeis por entre as trevas, a levando até um longo corredor. O telefone toca e há interferência, ruídos, dando ideia de que algo de errado está acontecendo. Ou está próximo. Eis que surge, em meio a escuridão, uma espécie de javali enorme, agressivo, investindo furiosamente contra a garota, que, sem querer, o avista pela lente de seu telefone: o rosto do porco gigante se transforma numa face humana! O flash da câmera o afugenta, além de nos consagrar com a primeira marcação na "ghostpedia", uma espécie de enciclopédia para as criaturas encontradas no caminho. Assim podemos descobrir mais sobre Babi Ngepet, aquilo que acabamos de enfrentar. DreadOut apresenta muito bem seus monstros, instigando interessados pelo tema a se aprofundar em leituras vindouras. Eu mesmo li muito sobre Pocongs, das coisas mais horrorosas visualmente que vi num jogo nesses últimos tempos. Trata-se de um morto enterrado amarrado, cuja alma penada busca libertar seu receptáculo. Outro que me chamou atenção: Kuntilanak, uma vítima de estupro que acaba grávida e enterrada viva com seu bebê. Dentro da trama de DreadOut, pouco é descoberto acerca de cada fantasma presente no local, mas o suficiente é entregue para gerar estranheza e instigar curiosidade, o que, para mim, já é o suficiente. Apesar da mediocridade de seus fundamentos, há neste primeiro ato uma aura de estranheza que não existiria numa produção convencional, realizada por desenvolvedores com os quais estamos adaptados. Tal teor de esquisitice se tornou de primeira importância para que eu passasse a recomendar DreadOut aos meus amigos fãs de terror, com um gosto especial pelo bizarro. Caso você se encaixe nesta categoria, algum proveito há de surgir.







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